Seja nos contratos de locação comercial ou residencial, por inúmeras vezes está presente a figura do fiador como garantidor do pagamento dos débitos decorrentes de um contrato de locação.
Fiador é aquele que responderá pelo pagamento da dívida na hipótese de inadimplemento do contrato pelo locatário. Este responde pessoalmente, ou seja, com todo o seu patrimônio disponível, pelo adimplemento contratual
É muito comum as imobiliárias e profissionais da área exigirem quando da locação a apresentação de um fiador com ao menos dois imóveis em nome próprio. Mas porque a solicitação de 2 (dois) imóveis?
A solicitação de 2 (dois) imóveis em nome do fiador é pratica comum, pois embora o fiador possa ter outros bens passíveis de serem penhorados, como por exemplo dinheiro em conta, veículos e outros, o imóvel, por ter menor liquidez e maior valor, acaba por ser o preferido dos locadores.
Dois imóveis eram exigidos, pois na hipótese de o fiador ter apenas 1 (um) imóvel, este poderia vir a ser considerado bem de família, em eventual ação judicial para execução/cobrança do débito, o que o tornaria impenhorável, mesmo na hipótese de este ter apresentado este como seu patrimônio apto à garantia contratual.
Logo, este fato trazia enorme insegurança jurídica às locações com esta modalidade de garantia, pois na hipótese de um único bem imóvel estar em nome do fiador, não havendo outros bens à penhorar, este poderia suscitar a proteção da lei federal 8009/1990 para não ter seu imóvel excutido.
No entanto, em acertada decisão proferida pelo Min. Alexandre de Moraes do Supremo , ao julgar o tema repetitivo 1091, acabou de vez com a controvérsia, definindo que no caso das locações, prevalece a autonomia de vontade das partes.
Logo, se o fiador optou por responder com todo o seu patrimônio pessoal pelo pagamento de eventuais dívidas oriundas do contrato de locação, não há que se falar em proteção ao seu imóvel, ainda que seja seu único bem, sob a perspectiva da lei 8009/1990.
Isto porque, o fiador expressamente anuiu com os termos contratados, e por expressa vontade optou por ser contratante nesta qualidade, não podendo inoportunamente se esquivar da obrigação sob o subterfúgio de deter apenas um bem imóvel.
Prevaleceu, no julgamento, o voto do relator, ministro Alexandre de Moraes, pelo desprovimento do recurso. Para o ministro, o direito à moradia, inserido na Constituição Federal entre os direitos sociais, não é absoluto. Ele deve ser sopesado com a livre iniciativa do locatário em estabelecer seu empreendimento, direito fundamental também previsto na Constituição Federal (artigos 1º, inciso IV e 170, caput), e com a autonomia de vontade do fiador, que, de forma livre e espontânea, garantiu o contrato.
Para o relator, a impenhorabilidade do bem de família do fiador de locação comercial causaria grave impacto na liberdade de empreender do locatário, já que, entre as modalidades de garantia que podem ser exigidas, como caução e seguro-fiança, a fiança é a mais usual, menos onerosa e mais aceita pelos locadores. Além disso, deve ser garantido ao indivíduo o direito de escolher se manterá a impenhorabilidade de seu bem de família, conforme a regra geral da Lei 8.009/1990, que dispõe sobre a matéria, ou se será fiador, consentindo expressamente com a constrição de seu bem no caso de inadimplemento do locatário. “A livre iniciativa não deve encontrar limite no direito à moradia quando o próprio detentor desse direito, por sua própria vontade, assume obrigação capaz de limitar seu direito à moradia”, afirmou.
Ele destacou, ainda, que, nos aluguéis comerciais, muitas vezes o fiador é o próprio sócio da pessoa jurídica afiançada, especialmente em se tratando de micro e pequena empresa. Assim, o empreendedor pode liberar seu capital financeiro para investi-lo no próprio negócio, enquanto o fiador, também sócio, escolhe seu direito de empreender, ciente de que seu próprio bem de família poderá responderá pela dívida. “Trata-se de decisão sua, em livre exercício de sua autonomia privada”, apontou.